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29/01/2010

Eu sei, talvez...

Foto: Helena Chiarello - arquivo pessoal

É lenta a força que me leva adiante a tentar desfazer os dias, as palavras e os gestos, a desejar não me ferir mais uma vez nessa esperança em ruínas, a tentar esquecer de vez o custo, o peso e a agonia desse meu passo cansado de percorrer o amor de forma tão sincera, cuidadosa e vulnerável.

Mesmo assim insisto e vou, a disfarçar os tropeços e a tentar não me deixar abater pela certeza de que sempre haverá o espanto, a brisa fria das verdades tecidas, a propositada investida das vozes agudas a emudecer a minha e a espraiada ironia dos risos fáceis a apagar o meu.

(Se ao menos eu pudesse derramar sobre a razão, gota a gota, essa sensação que me faz covas no peito, talvez conseguisse, ainda uma vez, desenterrar a alma.)

Eu sei, talvez, que como o tempo, tudo passa.

Eu sei, talvez, que é só por hora que permaneço aqui, na estridência desse silêncio, a desviar os olhos dessa clareza cortante, a fingir que há um lugar onde os instantes se apagam e toda a memória adormece.

Mas e a dor, como se esquece?


Helena Chiarello
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18/01/2010

Depois, é dia

Foto: Helena Chiarello - arquivo pessoal

É quando as horas foram mais longas que gosto de começar o dia assim, com uma alegria quase infantil a saltar da cama, a espiar pela janela os primeiros sinais de luz que veem trazer alívio à noite.
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Gosto desse instante em que a sombra chega ao seu limite e dilui-se entre os raios da manhã.
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Fico a apreciar a paisagem saída da madrugada, molhada de orvalho e confiança. Espreguiço-me demoradamente, ignorando a insônia recente com um encolher de ombros.
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Então respiro comprido, quase feliz por esse prazer insuperável de ver o sol nascendo, por esse gosto imaginário e indescritível de acreditar estarem se derretendo a noite, os pensamentos e os pesadelos à velocidade da luz.

Helena Chiarello
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